Um bolso virado para fora, que diz ele?
E porquê há sempre alguém que tentando ajudar sugere que o guardemos?
Talvez por saber que, como o bolso, expor o de dentro cause sempre certa estranheza e inadequação.
Ou porque os bolsos são originalmente talhados para ocultar e não para expor. E a subversão é quase sempre incômoda e pouco simétrica.
E quando as coisas não guardam simetria estabelece-se a angústia...
É como amar alguém e para preservar esse amor precisar estar apartado, por fidelidade ao que se sente.
A fim de que a mentira do cotidiano não mascare e ofusque o sentimento - o torne impuro.
Talvez por isso tantas bolsas, tantos zíperes, bolsos - pequenos compartimentos de nós mesmos.
Afinal, há muito o que esconder, temos muito medo e mundos...
E também esses escondemos de nós.
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24.4.07
22.4.07
Mi Negra
"MI ALMA es un carrousel vacío en el crepúsculo..." Pablo Neruda - Crepusculário.
Negra à janela, sou sombra indistinta na noite.
Lua, núvem, pássaro, paisagem.
Alheia e fria...
Minhas lágrimas - duas luas minguantes -
Obscura emoção, falso brilhante.
Pousada sob o luar, balouço lisa, escondida.
Cá toco céu e mistério,
Não tenho começo nem fim -
Sou ponto, reta, fresta, olhar.
Negra à janela, sou sombra indistinta na noite.
Lua, núvem, pássaro, paisagem.
Alheia e fria...
Minhas lágrimas - duas luas minguantes -
Obscura emoção, falso brilhante.
Pousada sob o luar, balouço lisa, escondida.
Cá toco céu e mistério,
Não tenho começo nem fim -
Sou ponto, reta, fresta, olhar.
4.4.07
De mim pra mim
"(...) fumo por escolhas a muito realizadas, decisões tomadas despreocupadamente. Entretanto me agrada particularmente a natureza da fumaça, o centramento que fumar me traz - o desanuviar das idéias. Eis o que mais me agrada. A solidão enfim cogitável, a textura de certas penumbras, a sinuosidade das luzes, a dança dos eflúvios... Os cigarros são minhas prostitutas queridas, eu pago por eles mas os tenho em zêlo, afeição e sincero interesse".
Eu, morada de minha alma, tenho em minha voz, falada, sua expressão mais audível. Audível e nem por isso a mais sonora. E muito menos a mais expressiva. A expressão mais reveladora de mim possivelmente são minhas mãos; com as quais dialogo com as tecituras, interajo com os corpos, me exprimo... Através delas falo, busco a gentileza de um olhar atencioso e sinalizo a farça que envolve as palavras. Meus pés se deliciam ao menor afago e encontram-se tremendamente plantados ao chão. E minha alma flutua lilás e vermelha, depositando a paixão excessiva, a inquietude e a sensualidade de minhas cadências. O corpo inteiro é delgado e tenro como uma fruta madura, sempre à espera de ser acolhido ou degustado. Com ele emito ondas perfumadas, nuvens de calor, roçados macios... Assim clamo quase sem querer e me escapam os brotos entre ronronados e uivos.