Certa feita você me perguntou, num de nossos intermináveis encontros,
porque, ou melhor, o que eu tanto olhava em você?
Como dizer amiga...
Não sei se posso descrever o alento e conforto de olhar para o lado e ver o seu rosto, sabê-la presente.
A paz que me traz olhar em seus olhos e sentir seu calor, sua ternura.
Ser o reflexo azul que pisca em seus olhos,
Fazer parte dessa compreensão estranha, desse companheirismo mágico, desse amor sempre a me comover.
Perceber que a cada mudança que sofremos, nos acompanharmos,
Vê-la mudar e permanecer perto, juntas.
A inusitada naturalidade de permanecer e assim desejar continuar.
Afinal, nos encontramos e por alguma razão nunca deixamos de nos procurar e rever,
Sempre a querermos mais estar, compartilhar...
E bem sei de sua fidelidade canina...
Entretanto meu amor é igualmente fiel e franco.
Às vezes sinto nossa amizade como uma folha que cai... poética, inesperada ou como vento forte e frio, gostoso que me invade e alegra.
Até ter você "identidade física" era só mais um termo quase sem sentido para justificar as mazelas do direito ou abrandá-las.
Entretanto, agora, ao menos, percebo que o termo é sem dúvida um princípio...
Afinal, a identidade física principia numa cascata de sensações intrincadas que iniciam as relações e conosco não foi diferente.
Kan-Ji, implicamos uma com a outra, uma na outra... Eu, por exemplo, se não tivesse você talvez já não bebesse mais a muito, ao menos não com o prazer de agora, é como se estivesse todo esse tempo aguardando me preparando para fazer companhia a você.
Sei que deve soar um pouco atravessado, afinal gosto do que faço. Mas é que com você faz sentido o que antes não passava de contraponto de uma espera.
Você é como o mar, às vezes escuresse noutras clarea, violento e suave, oscilante-quieta e estrondosa, que mesmo nos seus dias mais sombrios é impossível não amar ou ficar estasiado a olhar sua revolta...
Eu sou a areia onde fatalmente você quebra, onde o distino sempre a traz. Como saber quem vai ao encontro de quem? Se afinal não fujo, abarco suas oscilações e fluo com elas... Anoite e a aurora não se buscam, por serem assim mesmo opostas?
O mar pode fugir, secar ou não quebrar em ondas, mas a praia só pode esperar o mar, essa é a razão de seu existir - fazer companhia, estar ao lado, ter o privilégio de sempre ver o mar de frente.
Ah, é terrível... Estar vulnerável não me assusta, mas contigo tenho ainda menos medo. E sei que a partir daqui aspalavras me serão negadas, por pura ausência... Manterei meu espírito em paz porque o que estou a lhe dizer situasse no espaço entre uma linha e outra e só pode ser percebido no silêncio místico da epifania - e, em verdade, estou certa de que o ouvirá.
Você já pensou como dizer a quem lhe é caro tudo o quanto sente através apenas de referências? Não poderá falar ou escrever, mas mostrar uma música, imagens, cheiros, toques, olhares, tons, luminosidades, sabores, os mais diversos estímulos externos.
Seria difícil e belo - quiçá doloroso como quando usamos a linguagem (que nos é exterior e, porque não, estranha) para expresar nossas sentimentalidades só por estarem embebidas de nossos mais íntimos sentimentos... E, sobretudo, será de um risco imenso e por isso exigiria uma coragem maior ainda.
E pensar que continuo me perguntando, todos os dias e noites, do que enfim tenho medo. Não sabia que esse seria meu enigma... Será que serei docemente devorada pela Esfinge? Seria grata...
É assim que vejo o mundo... Através de minha vida amorosa, cheia de amores, de momentos cálidos, ternos. Repleta de gestos e registros de emoções vindas do amor que se acendia a cada visão de um ser amado: irmãos, amigos, amantes, grandes e singelos encontros de alma, repletos de afeição.
Visage = visão-miragem, torvelinho do outro. "Você é minha vida amorosa", aplico aqui essa sabedoria que me despertou e tocou fundo. Ora, se a minha vida é repleta de amor, nada de adorável que nela aconteça escapa ao universo de minha vida amorosa. Então se assim o é, uma vida plena de amor é toda ela, em sua integralidade, adorável...
Por isso me sinto plena sempre que penso ou rememoro você, embebida de amor, sou exatamente o que sinto e como faço. Afinal, não é isso que somos para os outros: aquilo que tocamos nele ou no mundo, como sentimos e nos fazemos sentir?
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Um comentário:
Você me seduz, com esse seu papo manso... risos!
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